quinta-feira, 16 de abril de 2009

Um Naufrágio Sem Náufragos (2ª parte)

(2ª parte)
O comandante Alonso Zeiber, não vendo o veleiro que devia pilotar, sem duvida decidira ancorar perto da costa para o esperar. Contudo, o andamento da escuna tinha qualquer coisa de estranho. Ao aproximar-se de terra, a sua velocidade não diminuiu, pelo contrário, aumentou. Por outro lado, a sua rota dirigia-o para paragens perigosas, atulhado de recifes e de bancos, notadamente o perigoso espigão de Clatsop, no qual mais do que um navio encalhara por causa da bruma, do mau tempo ou ainda da inexperiência dos seus comandantes.
O J.C.Cousins cortou a rota de um pequeno veleiro cujos tripulantes observavam o andamento da escuna com estupefacção. Estupefacção também experimentada pelos vigias do cabo Canby. Onde ia, portanto, Alonso Zeiber, esse marinheiro credenciado? Porque é que ele, que conhecia todos os perigos da costa, dirigia a sua embarcação em direcção a paragens que tinha feito evitar tantas vezes aos navios que pilotava?
- Certamente uma avaria – disse um dos vigias.
Isso poderia ser verdadeiro. A barra do leme estava bloqueada em consequência da quebra da transmissão. Ou um navio destruído tinha abalroando-o, falseado a ponta do leme. Nesse caso, porque Zeiber não levava as suas velas, não tentava uma manobra, uma volta desesperada de bordo? Ou ainda porque razão não fundeava as suas âncoras para evitar uma catástrofe?
Perguntas sem resposta. O J.C.Cousins continuava o seu curso em direcção à costa. O seu curso mortal. A bordo deviam já distinguir a mudança de cor do mar que anunciava os baixios e essa ligeira ressaca que revelava os bancos de areia. E, por trás desses bancos, o espigão Clatsop, e ainda por trás, a ponta Adams, esse esporão rochoso que encobria matas de pinheiros finos com os troncos torcidos pelos ventos do largo. E tudo isso, para a escuna, tinha a face de um naufrágio.
Um naufrágio absurdo. Causado nem pela tempestade, nem pela bruma, mas por uma força maléfica, uma força misteriosa que empurrava o J.C. Cousins em direcção a terra.
Se Zeiber não retomasse o controlo da sua embarcação, o casco elegante, o velame harmonioso, aquela obra-prima da construção naval, não seria em breve mais do que destroços, um emaranhado de madeira, cordame e telas que uma próxima tempestade dispersaria.
E esse naufrágio, essa morte de um navio, parecia tanto mais absurda, quanto teve lugar naquelas águas calmas, com aquele bom tempo, sob uma luz radiosa que simbolizava todas as belezas e todas as felicidades do mar.
O espigão de Clatsop não estava a mais de uma meia milha do J.C.Cousins. Estava ainda a tempo de dar meia volta. Havia ainda água suficiente diante da escuna para que esta evoluísse, para que ela passasse rente aos bancos de areia, para que retomasse ao largo, isto é, à vida.
Dentro de cinco ou dez minutos no máximo, seria demasiado tarde.
(continua)

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